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7 ingredientes da inteligência do seu filho que você não pode ignorar

Todo mundo disse ou ouviu alguma vez que “fulano já nasceu sabendo tal coisa”. Apesar de esta frase parecer exagerada, os neurocientistas lhe dão certa razão, pois, de acordo com eles, 50% do nosso potencial intelectual vêm da nossa carga genética. Os outros 50% são determinados pelo ambiente onde vivemos: a cultura, a escola, a família, etc. No livro “A Ciência dos Bebês”, o autor chama o primeiro fator de semente e o segundo de solo.

Se por um lado essa divisão 50–50 implica um limite para a capacidade cerebral de nossos filhos; por outro, implica o dever de oferecer a eles os melhores meios possíveis para o seu desenvolvimento (um bom começo é melhorar o relacionamento conjugal).

Neste e no próximo post, falaremos da semente e do solo da inteligência infantil. Hoje, apresento o resumo do capítulo sobre a base biológica da inteligência. As dicas de como otimizá-la ficam para a semana que vem.

Em busca do segredo da inteligência

A fim de descobrir se realmente existia um segredo da inteligência nos meandros do cérebro, os cientistas entraram a fundo na cabeça de alguns gênios — literalmente. No grupo dos famosos dissecados, podemos citar o matemático alemão Carl Gauss, o diabólico Vladimir Lenin e o físico Albert Einstein, cujo cérebro virou até notícia de jornal. Neste último, apesar da presença de algumas anomalias, não foi possível detectar nenhum padrão de genialidade na sua arquitetura cerebral.

Posteriormente, com o avanço da engenharia biomédica, tornou-se possível realizar pesquisas com os gênios ainda vivos, utilizando, por exemplo, ressonâncias magnéticas funcionais. Contudo, essas pesquisas também não conseguiram encontrar até agora o ponto chave da inteligência. Quando os pesquisadores começaram a observar pessoas com grande capacidade intelectual resolvendo problemas difíceis, não apareceram os esperados padrões de semelhança. Pelo contrário, o que se viu foram individualidades desconcertantes. Conclusão: a resolução de problemas e o processamento sensorial não têm a mesma aparência em quaisquer dois cérebros.

E na genética? Será que os pesquisadores descobriram o “gene da inteligência”? Mais uma vez, não! Os genes já isolados que guardam alguma relação com a inteligência contribuem com apenas 3 ou 4 pontos nos testes de QI.

Sem grandes sucessos na neuroanatomia, na neurociência e na genética, o que dizer então das pesquisas feitas pelo “lado de fora”, sobre o comportamento humano? Nelas, os cientistas encontram a mina de ouro. Hoje, por meio de uma série de testes, realizados com bebês de 2 a 8 meses de idade, é possível prever corretamente as pontuações de QI aos 18 anos!

Mas antes de você voar desta página a procura desses testes, vamos entender melhor o que o QI significa e o porquê do autor do “A Ciência dos Bebês” não dar tanto crédito a ele (com razão).

Fatos surpreendentes sobre os testes de QI

Pulando a parte em que o autor do livro conta a história dos testes de QI (abreviação de coeficiente de inteligência), vamos responder à pergunta mais básica sobre o assunto: o que é o QI?

Basicamente, ele é uma relação entre a idade mental de uma criança e a sua idade cronológica, multiplicada por 100. Assim, uma criança de 10 anos de idade que é capaz de resolver problemas normalmente resolvidos apenas por jovens de 15 anos tem um QI de 150: (15/10) x 100. Para a metodologia mais utilizada atualmente, 110 já é considerado um valor acima da média.

O QI ainda é muito valorizado por vários grupos, que vão desde as escolas (primárias) de elite até as agências espaciais. Mas se sair bem em um teste de QI significa que você é realmente inteligente? Talvez sim. Talvez não. Alguns pesquisadores acreditam que esses testes só servem para medir a sua capacidade de fazer testes de QI.

Para diminuir um pouco a relevância do coeficiente de inteligência, John Medina apresenta alguns dados interessantes; por exemplo: pesquisas mostram que ele é maleável, variando com o stress, a idade, a cultura majoritária do grupo de teste, a família (irmãos tendem a ter QIs parecidos) e a situação econômica. Crianças nascidas pobres e adotadas por famílias de classe média terão um ganho de 12 a 18 pontos. E como explicar que de 1947 a 2002, o QI coletivo de crianças americanas subiram 18 pontos (com as notas delas caindo nos testes internacionais)?

O que significa então ser esperto, inteligente?

OK, se os testes de QI não são lá grandes coisas, o problema continua. Os pais continuam querendo saber se seu filho é inteligente. Eles querem que seu filho seja inteligente.

Dada a variedade de habilidades intelectuais que existem, o mais plausível é rejeitar a noção de um único número como a palavra final sobre o poder do cérebro do seu filho. Temos que substituí-la por uma conceito mais abrangente.

De acordo com “A Ciência dos Bebês”, a inteligência humana é mais como ingredientes em um guisado do que números em uma planilha.

7 ingredientes da inteligência

Como o guisado não é um prato tradicional da cozinha brasileira, vamos aprender a receita com a mãe do professor Medina. Os principais ingredientes para um bom guisado são uma carne de qualidade e uma massa pastosa, chamada Roux, que serve para engrossar o caldo. Os outros ingredientes podem variar conforme a feira do dia.

A inteligência humana, assim como o “guisado da mamãe”, tem dois ingredientes essenciais, ambos ligados fundamentalmente a nossa necessidade de sobrevivência. Um ingrediente é a capacidade de gravar informações, também chamada “inteligência cristalizada”. Ela envolve os vários sistemas de memória do cérebro, que se combinam para criar um “banco de dados” ricamente estruturado. O segundo é a capacidade de adaptar as informação gravadas a situações únicas, cunhada “inteligência fluída”.

Os outros ingredientes do guisado da inteligência variam de família para família e de pessoa para pessoa. Uns têm mais facilidade para aprender línguas, outros em matemática; há aqueles com excelente capacidade comunicativa. John Medina destaca cinco desses ingredientes que nós, pais, deveríamos observar em nossos filhos:

  1. Desejo de explorar;
  2. Autocontrole;
  3. Criatividade;
  4. Comunicação verbal;
  5. Interpretação da comunicação não-verbal.

Desejo de explorar

Milhares de experimentos confirmam que os bebês aprendem sobre o seu ambiente por meio de uma série crescente de ideias auto-corrigidas. Eles fazem observações sensoriais, prevêem o que observam, planejam e implantam experiências capazes de testar suas previsões, avaliam os seus testes, e adicionam o conhecimento adquirido a sua memória em expansão. São verdadeiros cientistas e seu laboratório é o mundo.

Essa vontade de experimentar, de fazer perguntas extraordinárias sobre coisas ordinárias é um talento altamente valorizado no mundo do trabalho. De acordo com um importante e premiado estudo da Harvard Business Review, o “DNA do inovador” contém cinco traços característicos, dos quais listo três agora:

  1. Habilidade de associar criativamente;
  2. Hábito “irritante” de perguntar constantemente “e se?” e “por que não…?” e “como você está fazendo isso?”;
  3. Grande desejo de fuçar, remendar e experimentar.

O denominador comum destas características: o desejo de explorar. Infelizmente, inserimos nossos filhos em um sistema educacional que favorece exatamente o contrário. Hal Gregersen, um dos autores do estudo, resume bem essa triste situação:

“Se você olhar para crianças de 4 anos, elas estão constantemente fazendo perguntas. Mas no momento em que completam 6 anos de idade, elas param de fazer perguntas, porque aprendem rapidamente que os professores valorizam as respostas certas mais do que perguntas provocativas. Estudantes do ensino médio raramente mostram curiosidade. E quando crescem e adentram os ambientes corporativos, já tiveram a curiosidade expulsa deles. 80% dos executivos gastam menos de 20% do seu tempo na descoberta de novas ideias.”

Auto-controle

Vários vídeos como este abaixo exemplificam muito bem o auto-controle.

O controle dos impulsos faz parte de um conjunto de comportamentos conhecidos como funções executivas. Elas controlam o planejamento, a previsão, a resolução de problemas e a definição de metas. Elas envolvem muitas partes do cérebro, incluindo a chamada memória de curto prazo (memória de trabalho).

É sabido agora que as funções executivas são um melhor preditor de sucesso acadêmico do que o QI.

Quanto mais prática a criança tiver em gratificação atrasada, melhor ela exercerá o controle sobre seu comportamento. E o cérebro dela pode ser treinado para melhorar o autocontrole e outros aspectos das funções executivas. Contudo, a influência genética sempre estará envolvida, sem sombra de dúvidas.

Criatividade

Os pesquisadores acreditam que a criatividade tem alguns componentes básicos. Estes incluem a capacidade de perceber novas relações entre coisas antigas, evocar ideias ou coisas ou seja lá o que atualmente não existe. A criatividade também deve despertar emoções, positivas ou negativas, em outra pessoa. Algo — um produto –, um resultado, tem de surgir do processo. E isso envolve uma boa dose de riscos. Riscos? É. Um bom exemplo de CRIATIVIDADE, pouca (nenhuma) arte e muito risco é o urinol enviado por Marcel Duchamp para um concurso de arte em Nova York, em 1917.

Podemos prever a criatividade das crianças? O psicólogo Paul Torrance criou para isso uma bateria de exames conhecidos atualmente como Testes de Pensamento Criativo de Torrance (sigla TTCT em inglês). Embora os testes tenham suas críticas, os seus resultados guarda um boa relação com a futura produção criativa da criança. De fato, para a produção criativa, eles têm uma correlação três vezes mais forte do que o QI nativo pode prever.

Pesquise sobre “testes de Torrance” no Google para conseguir mais informações sobre a sua aplicação no Brasil.

Comunicação verbal

Não faltam teorias sobre como o ser humano adquire a linguagem. O famoso linguista Noam Chomsky acredita que nascemos com um programa de línguas pré-carregado em nossas cabeças; um pacote que ele chama de gramática universal.

Uma vez que a aquisição da linguagem começa, ela tende a desenvolver-se rapidamente. Dentro de um ano e meio, a maioria das crianças consegue pronunciar 50 palavras e compreender cerca de mais 100. Esse número explode para 1.000 palavras com 3 anos, e, pouco antes do sexto aniversário, para 6.000. Calculado a partir do nascimento, a taxa é de três palavras novas por dia.

Sobre a aprendizagem de novas línguas, a cientista americana Patrícia Kuhl descobriu que à época do nascimento, um bebê pode distinguir os sons de todas as línguas que já foram inventadas. Com um ano, contudo, essa janela de aprendizagem se fecha. O bebê consegue distinguir apenas aquelas línguas as quais foi exposto nos últimos seis meses.

Só uma coisa pode manter essa janela aberta. Alguém tem que falar diretamente com o bebê em outra língua. Se o seu cérebro detectar a interação social, seus neurônios começarão a gravar a segunda língua, os fonemas e tudo mais. Para executar essas tarefas cognitivas, o cérebro precisa de interação e estimulação rica em informações que só outro ser humano pode proporcionar. Em outras palavras: nada de desenhos! Desligue a TV e interaja com seu filho.

Interpretação da comunicação não-verbal

No post da semana passada, dei um exemplo de leitura de comunicação facial da minha esposa. Apesar da singularidade da linguagem verbal, ela é apenas um dos elementos do vasto universo da comunicação humana. Dentre os aspectos da comunicação não-verbal, dois se destacam: a comunicação gestual (“O Corpo Fala”) e as expressões faciais (“Lie to Me”).

Sobre a comunicação gestual, o livro dá uma dica excelente. Gestos e palavras usaram circuitos neurais similares enquanto se desenvolviam em nossa história evolutiva. Explorando essa teoria, cientistas americanos organizaram o seguinte experimento: crianças na primeira série escolar, com audição normal, participaram por 9 meses de um curso de língua de sinais. Em seguida, fizeram uma série de testes cognitivos. Foco de atenção, habilidades espaciais, memória e discriminação visual melhoram drasticamente, em até 50%, quando comparados com os testes das crianças que não tiveram nenhuma instrução formal.

Sobre as expressões faciais, John Medina ressalta uma dica que já apareceu neste post: desligue a TV e interaja com seu filho. Só assim ele irá desenvolver essa habilidade. Você se lembra do “DNA do inovador”? As outras duas características que não foram listadas antes são:

  1. Grande capacidade para um tipo especifico de networking: com aquelas pessoas com background educacional bem diferente do seu;
  2. Observação atenta de detalhes comportamentais.

Quer que seu filho se torne um inovador de sucesso? Garanta que ele domine a comunicação não-verbal e não deixe a curiosidade dele morrer.

Próximo capítulo: preparando o solo para a semente da inteligência

Apesar de poder desempenhar um papel importante no futuro sucesso das crianças, os testes de QI não são capazes de medir a maioria dos elementos discutidos neste post. A inteligência do seu filho pode estar em características que não são passíveis de medição.

E como você sabe, não contamos apenas com a genética, com a semente. Parafraseando o livro, no próximo post vamos sujar as mãos, conhecendo algumas descobertas valiosas para melhor cultivar o solo da inteligência dos nossos pequeninos.

(crédito das imagens: Wikimedia e Flickr)

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Por Frederico B. Teixeira. CC BY-NC-SA.

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